
A porta de aço de um cofre bancário possui segredos e fechaduras temporais, mas seu mecanismo decisivo é o trinco morto. Uma alavanca simples que, uma vez acionada, torna o acesso irreversível. Não importam combinações ou recursos; quando ele cai, estabelece uma verdade elementar: ou se está dentro, protegido, ou fora, à mercê do que vem.
A política nacional conhece bem esse mecanismo. Conhece bem o impersonalismo que certas decisões têm, e precisam ter, quando o que se está em jogo é o destino de um país tão gigante e tão imperfeito quanto o Brasil. A variável da esperança, cedo ou tarde, se vê substituída pela da inevitabilidade.
A imprensa tem um papel fundamental – nem sempre positivo – em traduzir o barulho que a queda do trinco final causa. Rumores são plantados diariamente para semear dúvidas, incapazes de mover as alianças fundamentais. Hoje, o país tem uma dessas alianças com o governo americano, uma barreira natural contra o avanço de um projeto que não respeita fronteiras nem soberanias. A verdadeira ameaça, então, é mesmo a interna: esse sistema de poder que opera com o objetivo único da reconfiguração das próprias engrenagens da nação.
O mercado, sempre arredio a qualquer movimento que não venha com luva de pelica, interpreta como risco essa linha de giz traçada ao chão da política nacional. Tal reação, no mínimo miope, que não vê o perigo real, está justamente na não definição de um polo, na ilusão de que existem atalhos civilizados para deter essas forças políticas donas do sistema atual, que desconhecem as regras do jogo civilizado. Mas essa reação também pode ser intencional, se o mercado tiver decidido se aliar justamente com aqueles que usurpam os poderes legislativos, ameaçam a democracia, se unem ao bolivarianismo narcoterrorista. Seja como for, o mercado sabe muito bem que a fragmentação é o campo fértil onde esses abutres que agem contra o país se refestelam, unidos sob a bandeira da destruição do país, enquanto o lado que tem amor à pátria se perde em intrigas de vaidade, em nomes levantados pela Faria Lima em salas refrigeradas que se desfazem ante ao menos sinal de pressão.
O futuro não precisa ser descrito em cenários de ruína para ser compreendido. Basta observar a direção. Quando a resistência se divide, o flanco da oposição se abre, a prioridade deixa de ser a unidade para ser a sorte individual. A oposição ao mal não precisa ser brilhante, precisa apenas ser coesa. E contra uma coesão férrea, a fragmentação é sempre derrota anunciada.
A definição e a unidade precisam transcender as personalidades. Devem ser sobre função. É preciso reconhecer que, em certos momentos da vida, a única resposta possível à uma força que só busca destruir é uma contra-força igualmente sólida, única e indivisível. É o pino de aço que se insere na engrenagem para travar seu movimento. Não se pede adoração ao trinco, se pede o entendimento da sua função na mecânica da preservação.
Este é o momento que estávamos esperando. As discussões partidárias, sempre secundárias, acabaram. Ou a resistência à aliança socialista-liberal se consolida como um bloco impermeável e resoluto, ou será dispersada pelo vento que o sistema faz soprar com força na porta do país. O erro fatal seria acreditar que ainda há tempo para escolher o formato da resistência, do trinco, da fechadura. Esse tempo já se esgotou.
O som que se ouve não é de campainha, mas do último trinco caindo no lugar. A partir de agora, resta uma única decisão: ficar do lado de dentro da história, ou ser deixado do lado de fora de um futuro que não perdoa hesitações.
A hora não é a de escolher rostos. É hora de escolher lados.