Por Lorenzo Carrasco e Geraldo Luís Lino

Em um artigo publicado na plataforma Pipeline do Valor Econômico (09/03/2025), Eduardo Mufarej, Chief Investment Officer da gestora Just Climate, afirma que a “ciência das mudanças climáticas” não deveria estar em discussão, reiterando a posição prevalecente de que as emissões de carbono das atividades humanas seriam as responsáveis pelos chamados extremos climáticos observados nas últimas décadas.  

Assim sendo, faz uma advertência aos investidores em oportunidades “sustentáveis”: “A transição para energias limpas, o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e o investimento em infraestrutura verde podem gerar empregos, impulsionar a inovação e promover o crescimento econômico. A sociedade e os investidores não podem se dar ao luxo de perder essa chance. Portanto, adiar a ação climática não só coloca o planeta em risco, mas também abre mão do potencial de progresso e prosperidade (grifos nossos).”

Ora, se as discussões sobre o clima global se orientassem estritamente pelo método científico consagrado, elas realmente se encerrariam rapidamente, mas não com a conclusão sugerida por Mufarej. Afinal, antes que as disciplinas científicas dedicadas ao tema, em especial a Climatologia e a Paleoclimatologia, fossem mobilizadas para a linha de frente da cruzada global contra as emissões de carbono das atividades humanas, os seguintes fatos eram tidos como universalmente aceitos:

1) O clima global está sempre em mudança. Em toda a história geológica da Terra, nunca houve e nunca haverá um clima “estático”, tendo o planeta oscilado entre os extremos “bola de neve”, com todo ele coberto por gelo, e “estufa”, sem gelo acumulado em qualquer parte dele. Felizmente, tais extremos são raros, mas o fato inegável é que a expressão “mudança climática” constitui um pleonasmo.

2) Nesse contexto, têm havido temperaturas atmosféricas e oceânicas e níveis do mar mais altos e mais baixos que os atuais. Há 22 mil anos, no auge do último período glacial, as temperaturas médias eram 8-10oC inferiores e o nível do mar estava a 130 metros abaixo do atual. Na época geológica chamada Holoceno Médio, entre 6000-8000 anos atrás, já dentro do período de existência da humanidade civilizada, temperaturas e níveis do mar eram superiores aos atuais, enquanto as concentrações de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera eram 40% inferiores às atuais. Os modelos climáticos usados para justificar a atual visão catastrofista do clima não explicam tal contradição fundamental.

3) Quando se analisam os padrões de oscilações das temperaturas e níveis do mar do período posterior à Revolução Industrial do século XVIII, não se observam quaisquer anomalias  em relação aos registrados nos séculos e milênios anteriores, antes que a humanidade começasse a empregar os combustíveis fósseis. Em outras palavras, não há como se distinguir uma “impressão digital” humana nos padrões dos últimos 150 anos (exceto nas cidades, devido à impermeabilização do solo, mas este é um fenômeno essencialmente limitado às áreas urbanas, que ocupam menos de 0,9% da superfície total do planeta).

4) Antes da politização das ciências do clima, os períodos mais quentes que o atual eram conhecidos como “ótimos climáticos”, pelo entendimento geral de que tanto a biosfera como a humanidade se dão melhor em climas mais quentes do que nos frios.

Tais constatações são oriundas de milhares de estudos realizados nos seis continentes e publicados ao longo do último século por literalmente dezenas de milhares de cientistas de instituições de pesquisa de dezenas de países de cinco continentes, facilmente encontráveis na literatura científica por quem se dispuser a conhecê-los. 

Lamentavelmente, a grande maioria deles tem sido ignorada pelo que se tornou uma autêntica indústria do catastrofismo climático, baseada nos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), desde o início orientados para avaliar “o risco de mudanças climáticas induzidas pelo homem, seus impactos potenciais e opções para adaptação e mitigação”, como consta do relatório de 1990. Ou seja, todo o empenho é direcionado para demonstrar a suposta influência humana, com ênfase nas emissões de CO2 e nos demais gases de efeito estufa – metano, óxido nitroso etc. Os demais fatores – raios cósmicos, atividade solar, características orbitais da Terra, correntes oceânicas, distribuição dos continentes e oceanos, cobertura de nuvens, relevo continental, vegetação etc. –, que já influenciavam decisivamente a dinâmica climática antes da industrialização humana, são convenientemente relegados a um plano secundário. 

O curioso é que alguns dos próprios operadores da agenda catastrofista admitem que ela não tem nada a ver com o estado da atmosfera. Um deles é o economista alemão Ottmar Edenhofer, vice-diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impactos Climáticos (PIK) e ex-copresidente do Grupo de Trabalho 3 (WG3) do IPCC. Em uma entrevista ao jornal suíço Neue Zürcher Zeitung (14/11/2010), ele afirmou: 

“Basicamente, é um grande erro discutir a política do clima separadamente dos grandes temas da globalização… É preciso libertar-se da ilusão de que a política climática internacional é política ambiental. Isto não tem mais quase nada a ver com política ambiental, com problemas como o desmatamento ou o buraco na camada de ozônio.”

Na mesma tecla bate seu colega Hans-Joachim Schellnhuber, cofundador do PIK e um dos cientistas mais influentes na promoção do alarmismo climático, tendo sido assessor científico da chanceler alemã Angela Merkel e do papa Francisco, na elaboração da encíclica Laudato Si, de 2015. Ele é também o criador do “número mágico” de 2oC, que seria o limite de aumento da temperatura que não poderia ser superado, sob o risco de provocar um “aquecimento descontrolado” da atmosfera da Terra. Pois vejamos o que ele admitiu, em uma entrevista de 2010 à Spiegel International (01/04/2010):

“Dois graus não é um limite mágico – é claramente um objetivo político. O mundo não vai acabar logo, no caso de um aquecimento mais forte… A realidade, claro, é muito mais complicada. Sim, eu me assumo culpado.”

E ouçamos também Al Gore, ex-vice-presidente dos EUA, Prêmio Nobel da Paz de 2007 e um dos maiores promotores dos “investimentos verdes”, sendo fundador da Just Climate. Eis um trecho de uma entrevista de 2018 à rede de televisão PBS, em que a entrevistadora comenta o tom alarmante de um relatório divulgado pelo IPCC naquele ano:

“Judy Woodruff – Eles estão pintando um quadro muito mais alarmante sobre o que enfrentamos, do que sabíamos anteriormente.

“Al Gore – A linguagem que o IPCC usou na apresentação foi um pouco torcida para cima, adequadamente – de que outra maneira eles conseguiriam a atenção dos formuladores de políticas de todo o mundo?”

Exagerar na linguagem catastrofista – ou “torcer para cima”, no eufemismo de Gore – tem sido o modus operandi padrão dos mentores do ambientalismo desde o início, continuando até hoje. A intenção é clara: criar um forte impacto na opinião pública para justificar as medidas políticas, econômicas e financeiras “salvadoras”, supostamente, em benefício de toda a humanidade.

Medidas que, em sua maioria, são direcionadas para uma desnecessária “descarbonização” acelerada da matriz energética e da produção industrial e agropecuária mundial, e para inócuos instrumentos financeiros baseados na comercialização de emissões de carbono (cuja relevância econômica real não é diferente da de um hipotético comércio de água da chuva engarrafada).

Em suma, o que Eduardo Mufarej defende não é propriamente a integridade da ciência do clima, mas a percepção de viabilidade de um negócio que já deixou os seus melhores dias para trás e se assemelha cada vez mais à bolha das tulipas holandesas do século XVII.

Voltaremos ao assunto.

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