É um escárnio tão gigantesco que beira o inacreditável. Enquanto o país acompanha a investigação de um esquema bilionário de fraude no INSS, a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais, a CONAFER, além de seguir operando, promove treinamento online para captar novas vítimas. O presidente da entidade, inclusive, é aguardado para depor na CPMI. E, no entanto, a máquina de sangrar aposentados não para.
Essa desfaçatez é a certeza da impunidade. É a demonstração pública da blindagem política que permite zombar das instituições e da lei, mesmo diante de um prejuízo estimado em R$ 6,3 bilhões e milhões de aposentados lesados.
O modus operandi da captura é tão primário quanto cruel. A mais barata engenharia social: sites que forjam depoimentos, fotos e vídeos de supostos beneficiados, em uma tática que não se difere em nada dos golpes de internet que vendem produtos milagrosos sem entrega garantida. O cinismo atinge o ápice quando se descobre que o novo “recrutador” ganha 10% de comissão por cada vítima trazida para o esquema de descontos indevidos.
A CONAFER exemplifica o crescimento obsceno do esquema. Seus descontos saltaram de R$ 400 mil para R$ 277 milhões anuais entre 2019 e 2024. O relatório da Polícia Federal atesta que a entidade chegava a descontar valores 180% acima do autorizado, uma prova cabal de sua agressividade predatória. Mas como um crime de tal magnitude consegue operar com tamanha liberdade e se expandir tanto?
A resposta reside na chave mestra da impunidade: as ligações políticas que fornecem o oxigênio institucional. O esquema não tem cor ideológica, tem apenas sede de dinheiro e tentáculos transversais em Brasília.
De um lado, a CONTAG, a maior entidade em volume de descontos e com histórico ideológico ligado ao PT, goza de prestígio e tem ampla presença nos conselhos do governo Lula. De outro, a CONAFER, embora se diga apartidária, mantém fortes elos em Brasília, garantindo capilaridade no Congresso e nos ministérios.
A prova de que a proteção é institucionalizada remonta a 2019. Quando o governo Bolsonaro tentou dificultar a vida dessas associações com a Medida Provisória 871, a reação veio do Congresso: a maioria das emendas que manteve a porta aberta para a continuidade da fraude foi apresentada por partidos de esquerda. A pressão política funcionou e o roubo foi mantido.
Para completar o cenário de promiscuidade, o Sindnapi, outra associação que multiplicou seus lucros com os descontos e está na mira da PF, tem entre seus dirigentes Frei Chico, irmão do Presidente da República.
Essa teia de conexões – passando por partidos da base do governo, ex-dirigentes ligados ao PT e lobby do Centrão – mostra que a fraude contra o aposentado é um sistema institucionalizado.
A CPMI do INSS é, neste momento, a única chance real de desmantelar a rede. Não basta prender intermediários ou gestores de segundo escalão. A prova de fogo da comissão será mostrar que tem a coragem política para cortar o oxigênio que sustenta a CONTAG, a CONAFER, O SINDNAPI e o restante da máfia.
Enquanto isso não acontecer, eles seguirão rindo da nossa cara, promovendo novos treinamentos e atraindo novas vítimas. Afinal, por que parar se o sistema garante que a impunidade é a regra?