Ao tentar desqualificar Donald Trump e desmoralizar a tarifa de 50 por cento imposta aos produtos brasileiros, o Estadão acabou revelando o que o governo ainda tenta fingir que não existe: uma crise de percepção internacional tão grave que já extrapolou a retórica diplomática e atingiu a espinha do comércio exterior.
A coluna, publicada no dia 29 de julho, não nega o conteúdo da carta enviada pela Casa Branca. Pelo contrário: confirma com todas as letras que os Estados Unidos condicionaram o recuo da tarifa ao encerramento do processo judicial contra Jair Bolsonaro. Não há dúvida. Não há especulação. Está escrito. E foi publicado justamente por quem deveria ajudar a conter o dano — não ampliá-lo.
A reação do jornal foi emocional. Em vez de enfrentar os fatos, partiu para a desqualificação do emissor. Trump foi chamado de amalucado, mitomaníaco, desequilibrado e chantagista. Nenhuma dessas palavras responde à carta – apenas demonstram que, quando não há como negar a realidade, resta gritar contra ela. E foi exatamente isso que o Estadão fez.
Mas ao atacar a forma, o jornal reforçou o conteúdo. E ao se escandalizar com a exigência, reforçou a gravidade do cenário. A tentativa de transformar uma resposta diplomática em delírio ideológico apenas confirmou que o país já não consegue mais esconder a instabilidade institucional que projeta para fora.
A crise não foi fabricada em Washington. Ela foi percebida em Washington. A tarifa não é causa, é consequência.
O problema não está na carta. Está no fato de que qualquer ator externo que aponte a disfunção do país passa imediatamente a ser tratado como inimigo. Não importa se é governo, imprensa internacional ou agência de risco. Qualquer diagnóstico que ultrapasse a fronteira vira ataque. Qualquer repercussão vira conspiração. E qualquer tentativa de ajuste se transforma em rendição.
O Estadão não quis admitir a verdade. Mas acabou fazendo exatamente isso. Expôs que não há estratégia de negociação. Expôs que o Brasil não está fazendo exigência alguma. E expôs que a única resposta oficial foi o silêncio — embalado por uma retórica midiática que já não convence nem os seus.
O editorial revelou mais do que o governo gostaria. Revelou que a imprensa aliada ao sistema não sabe mais como esconder o colapso da autoridade institucional do Brasil diante do mundo. A função da carta foi ser direta. A do Estadão, tentar transformá-la em delírio. Mas ao fazê-lo, entregou o ponto.
Confirmaram a inação do governo sem querer. E quando até a imprensa que sempre operou como amortecedor narrativo começa a gritar, é porque nem ela acredita mais ser possível disfarçar a gravidade do que está acontecendo.