O Brasil, atolado em um debate público repleto de lugares-comuns, jargões e futilidades, conta com uma classe falante que mal entende o papel e a importância da intelligentsia nacional para a soberania e o desenvolvimento do país.

O conceito de intelligentsia surgiu no século XIX, no contexto da Rússia czarista, referindo-se à classe de intelectuais comprometidos com a crítica ao regime e com a busca por reformas políticas. A palavra tem origem no latim, derivada de intelligentia, que significa “inteligência” ou “capacidade de compreender”. No entanto, foi na Rússia que o termo ganhou um significado específico, descrevendo não apenas aqueles dotados de conhecimento, mas também aqueles que se sentiam moralmente responsáveis por iluminar e desafiar a sociedade.

Nos impérios europeus do século XIX, a intelligentsia consolidou-se como um grupo distinto de escritores, filósofos, acadêmicos e artistas que viam a cultura e a educação como ferramentas para a transformação social. Na Rússia, destacou-se especialmente pela oposição à autocracia czarista e pelo desejo de reformar o sistema.

Em síntese, a intelligentsia é uma casta de intelectuais públicos — nem sempre brilhantes, mas sempre públicos. Esse grupo tem a capacidade de influenciar o debate por meio da divulgação de suas opiniões.

Uma característica essencial das sociedades de massa é justamente a influência que essa casta exerce sobre os cidadãos, muitas vezes transcendendo fronteiras e idiomas. É evidente que um debate público pautado pelo interesse nacional, pela preservação da cultura e pelo diálogo com princípios universais traria enormes benefícios para a nação.

Não é exagero afirmar que a soberania nacional depende de intelectuais públicos com essa orientação. Sem um pequeno grupo de analistas críticos das iniciativas multilateralistas de governos anteriores nos EUA, talvez não tivéssemos um governo Trump em 2016, nem o atual. Para superar a resistência dos americanos à dissolução da soberania nacional, o multilateralismo foi apresentado como um imperativo econômico e uma forma de preservar e ampliar a liderança global dos EUA. De Clinton em diante, toda a política externa pode ser resumida em esvaziar o poder nacional americano enquanto finge fortalecê-lo. Como as iniciativas globalistas tornaram-se progressivamente mais intrusivas e prepotentes, os EUA passaram a ser responsabilizados por todas as suas consequências negativas.

Atualmente, estamos presenciando uma mudança na ordem internacional. Sua estrutura hierárquica está menos rígida, e os agentes da política internacional perceberam que o mundo baseado em regras formuladas pelo consenso de Washington é insustentável. O planeta atravessa um processo de desglobalização, marcado pela retração das infraestruturas que antes o interligavam.

Os dispositivos jurídicos, institucionais e políticos de cooperação internacional estão sendo abandonados por países com um mínimo de independência, dada sua inviabilidade e o risco de intervenções abusivas.

Quando a classe falante brasileira tentará compreender esse processo histórico em curso? Até quando essa casta desinteressada e omissa manterá sua autoridade e influência pública por aqui?

Enquanto discutimos histericamente a defesa da democracia e a preservação do Estado de direito, outras nações estudam como nos explorar e corporações avaliam formas de perpetuar nossa condição de dependência econômica.

Nossa “intelligentsia”, no entanto, continuará a twittar colericamente, tratando a política e a vida nacional como uma novela mexicana. Enquanto isso, o trem da história passa mais uma vez.

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