
Por Lorenzo Carrasco e Geraldo Luís Lino
A julgar pelo noticiário prevalecente, o mundo estaria às portas de uma suposta emergência climática, que ameaçaria o futuro próximo da humanidade e cujo enfrentamento implicaria mudanças radicais em praticamente todos os aspectos das atividades humanas, a começar pela matriz energética, com uma rápida redução no uso dos combustíveis fósseis – carvão mineral, petróleo e gás natural – e inevitáveis ajustes para baixo nas aspirações e planos de desenvolvimento de cada país e sociedade do planeta.
Felizmente, tal emergência não existe no mundo real, apenas na agenda do ambientalismo, esta ideologia criada e instrumentalizada para, essencialmente, convencer os povos e os países ainda não desenvolvidos de que a Terra não teria os recursos naturais necessários e o meio ambiente não suportaria as suas pretensões de atingirem níveis de desenvolvimento socioeconômico, pelo menos próximos dos das nações avançadas.
Todo o discurso do “desenvolvimento sustentável” e suas eufônicas palavras de ordem – “capacidade de suporte”, “pegada” ecológica ou de carbono, “sobrecarga da Terra” e outros conceitos afins – é orientado para tal finalidade. A histeria climática e a pauta do “carbono líquido zero” (net zero) são parte desse processo.
O discurso apocalíptico sobre o clima se baseia na tese de que as emissões de carbono das atividades humanas – combustíveis fósseis, agropecuária etc. – estariam provocando um aquecimento ameaçador da atmosfera. Porém, para que isto fosse verdadeiro seria preciso que as oscilações das temperaturas da atmosfera dos oceanos e dos níveis do mar, a partir da Revolução Industrial do século XVIII, apresentassem anomalias em relação aos registrados nos séculos e milênios anteriores. Mas tais anomalias simplesmente não existem e, assim, não há qualquer evidência concreta da alegada influência humana na dinâmica climática global.
Há 6.000-8.000 anos, na época geológica conhecida como Holoceno Médio, as temperaturas atmosféricas oceânicas e os níveis do mar eram superiores às atuais, mas as concentrações de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera eram cerca de 40% inferiores. Os modelos climáticos catastrofistas não explicam tal contradição, evidenciando que outros fatores influenciam de forma preponderante à dinâmica climática global.
Alguns dos próprios operadores da agenda catastrofista admitem que ela não tem nada a ver com o estado da atmosfera. Um deles é o economista alemão Ottmar Edenhofer, vice-diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impactos Climáticos (PIK) e ex-copresidente do Grupo de Trabalho 3 (WG3) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), duas das principais agências engajadas no fomento do alarmismo climático. Em uma entrevista ao jornal suíço Neue Zürcher Zeitung (14/11/2010), ele afirmou:
“Basicamente, é um grande erro discutir a política do clima separadamente dos grandes temas da globalização… É preciso libertar-se da ilusão de que a política climática internacional é política ambiental. Isto não tem mais quase nada a ver com política ambiental, com problemas como o desmatamento ou o buraco na camada de ozônio.”
Simples assim.
Em seu notável livro Uma demão de verde: os laços entre grupos ambientais, governos e grandes negócios (Capax Dei, 2007), a jornalista investigativa canadense Elaine Dewar vai às raízes de tais ligações dissimuladas entre o ambientalismo e o big business internacional.
Desde a década passada, um volume crescente de instrumentos financeiros tem sido veiculado com rótulos vinculados às agendas climática, da sustentabilidade, das pautas ESG (ambiental, social e governança) e outras afins. Em 2022, segundo o Climate Policy Institute, esse montante chegou a quase US$ 1,5 trilhão.
De fato, muito pouco disso tem valor real para o financiamento de ações efetivas de proteção ambiental vinculadas a processos de desenvolvimento socioeconômico, a única maneira de se assegurar cuidados reais com o meio ambiente, em vez de transformá-los em fins em si mesmos e instrumentos políticos antidesenvolvimentistas.
Enquanto isso, as emergências reais que afligem a humanidade são outras. Vejamos apenas uma breve listagem delas, cujo enfrentamento a sério não tem recebido sequer uma fração da atenção, dos recursos e do tempo dedicados à agenda do catastrofismo climático (e desperdiçados com ela):
* As deficiências de infraestrutura de saneamento básico constituem, de longe, o maior problema ambiental do mundo, afetando mais da metade da população mundial e brasileira. O lançamento de esgotos sem tratamento nos cursos d’água é uma das principais fontes de poluição da água – que está longe de um risco de escassez física, como apregoam alguns alarmistas, basta que se deixe de poluí-la. Na terceira década do século XXI, é ultrajante que mais de 1,5 bilhão de pessoas ainda tenham que fazer suas necessidades fisiológicas ao ar livre. Enquanto milhares de organizações não-governamentais (ONGs) de todo o mundo se acotovelam para anunciar o apocalipse climático (e lucrar com ele), apenas um punhado delas se dedica à questão crucial do saneamento.
* A gestão do lixo urbano é outro problema ambiental da maior gravidade. No Brasil, mais da metade dos municípios ainda depende de lixões a céu aberto, a forma mais primitiva e de maior impacto ambiental de disposição de resíduos urbanos, enquanto a coleta seletiva, a reciclagem e o aproveitamento energético do lixo ainda engatinham.
* A ocupação irregular de áreas de risco, como encostas, várzeas fluviais e outras, representa um sério problema nos países que não integram os “40 ricos”. No Brasil, são recorrentes os problemas causados nessas áreas por qualquer chuva mais intensa.
* O sistema financeiro internacional, crescentemente divorciado da economia real, disputa com méritos o pódio de maior fator de “insustentabilidade” do planeta, por atuar como um parasita da economia física, canalizando a grande maioria dos recursos financeiros para instrumentos especulativos e improdutivos.
* O aumento das desigualdades globais tem sido a principal consequência da globalização financeira, tanto entre os países como dentro deles, e está na raiz de grande parte das convulsões políticas e sociais registradas nas últimas décadas.
No caso do Brasil, ainda podemos acrescentar:
* O esgotamento do bônus demográfico e a queda vertical das taxas de fertilidade, com o consequente envelhecimento rápido da população.
* Desindustrialização e perda de complexidade econômica.
* Déficit educacional que resulta no despreparo de grande parte da juventude e da população adulta para lidar com os impactos das tecnologias digitais e de informação nos processos produtivos.
Quanto à badalada transição energética, não há motivos para que ocorra com a celeridade apregoada pelos arautos do apocalipse climático e, menos ainda, na forma proposta por eles, com ênfase em fontes geradoras de baixa densidade energética e eficiência, caso das eólicas e solares. Ao contrário, deve avançar no rumo das fontes de alta densidade energética, em especial, as novas gerações de motores de combustão avançados, energia nuclear (inclusive, pequenos reatores modulares) e energia de fusão, ao ritmo dos investimentos sensatos feitos por governos e agentes privados.
Em suma, é hora de se jogar no lixo a “pílula verde” do catastrofismo e abrir os olhos com a pílula vermelha do mundo real.