A entrada em vigor das tarifas impostas pelos Estados Unidos marca um ponto visível da crise, mas o processo que nos trouxe até aqui começou bem antes. O Brasil não foi surpreendido por uma medida protecionista isolada. Foi, aos poucos, reposicionado no sistema internacional como um país instável do ponto de vista institucional. O gesto de Washington apenas torna explícito o que já vinha se acumulando.
A letargia interna chama mais atenção do que a própria tarifa. O decreto americano não disfarça o motivo. Cita nomes do Judiciário, aponta violações e trata o Brasil como fator de risco para a segurança jurídica e política. Ainda assim, parte da elite econômica insiste em interpretar tudo como ruído técnico. Segue apegada ao impacto fiscal, ao efeito sobre exportações e às perdas de curto prazo, como se o problema fosse pontual.
Esse descompasso entre a leitura internacional e a resposta doméstica não é por acaso. Durante anos, os principais setores do empresariado optaram pelo silêncio. Evitaram confronto com autoridades, ignoraram a escalada institucional e apostaram que a distância seria suficiente para proteger seus interesses. Mas essa estratégia, que parecia cautelosa, custou caro.
O silêncio foi lido lá fora como aceitação. A neutralidade passou a ser vista como parte do problema. E, quando não há vozes internas que façam contraponto, a percepção externa se ajusta. A elite econômica, que já teve papel de mediação institucional, perdeu essa função. O sistema internacional passou a reagir diretamente ao que vê: um país sem garantias mínimas de estabilidade e de respeito às regras.
A tarifa confirma uma crise já existente. O sinal mais grave veio antes, com a perda de confiança, a saída de capital, a redução de exposição ao risco Brasil. E o que virá depois tende a ser mais difícil de medir: retração de investimentos, maior isolamento e perda de posição nas cadeias estratégicas.
O centro da questão é a ausência de reação institucional diante de uma ruptura que se naturalizou. Quando o país não reage, o mundo reage por ele. E cobra.
A elite econômica teve tempo, sinal e espaço para agir. Preferiu esperar. Preferiu acreditar que o técnico sobreviveria ao político. Hoje, as tarifas entram em vigor. Mas o custo já vinha sendo pago há muito tempo. E o preço mais alto ainda nem começou a ser cobrado.