
O Brasil atual não desenvolveu, discutiu ou propôs um projeto de nação. Nenhum dos agentes que poderia ter iniciado esse processo demonstrou interesse real no desenvolvimento de um plano estratégico para o país.
Em meio a tantas mudanças na ordem internacional e no comportamento dos agentes políticos de alcance mundial, o Brasil não adequou minimamente suas políticas, instituições ou relações diplomáticas para se preparar para os desafios da nova organização global.
No atual cenário geopolítico, a falência do Brasil seria extremamente conveniente para diversos países. Desde o estamento anglo-americano até os imperialistas chineses, todos os grupos internacionalistas vêem a degradação do país como uma oportunidade estratégica.
No entanto, ainda estamos nos comportando como se fosse possível vender toneladas de produtos in natura para dezenas de países, sem desenvolver nossa segurança alimentar interna.
Grandes players estão estimulando países a buscarem sua “soberania alimentar” para garantir a estabilidade econômica, política e a unidade nacional como um todo. Alimentos são essenciais para a vida humana, mas parece que nos habituamos a um mundo sem conflitos bélicos, com transporte marítimo de toneladas de alimentos diariamente.
Um exemplo de país que está em busca de sua soberania alimentar é a China. A potência asiática apresentou um plano ousado de aumento da produção de alimentos visando sua autossuficiência e sua soberania alimentar.
O “Plano de Ação de Agricultura Inteligente 2024-2028”, lançado pelo Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China (MARA) em 23 de outubro de 2024, é uma estratégia ambiciosa para aumentar a produtividade do agronegócio nacional por meio da digitalização. O plano reflete a necessidade de modernizar a agricultura em um país que, apesar de ser o maior produtor mundial de grãos (mais de 700 milhões de toneladas anuais), enfrenta desafios como escassez de terras aráveis, envelhecimento da força de trabalho rural e dependência de importações de soja e grãos. A iniciativa busca garantir segurança alimentar e eficiência, integrando tecnologias avançadas ao setor agrícola.
O projeto tem como meta alcançar uma taxa de integração digital superior a 32% na produção agrícola até 2028. Para isso, propõe três frentes principais: criar uma plataforma nacional de big data agrícola para análise e gestão de dados; desenvolver tecnologias de plantio digital com inteligência artificial (IA), GPS e Internet das Coisas (IoT), permitindo agricultura de precisão; expandir para 10.000 fazendas modelo, como as “Fazendas Fuxi” em Zhejiang, que servirão como exemplo de inovação – essas fazendas usarão máquinas inteligentes, como tratores autônomos e drones, para automatizar processos e otimizar recursos como água e fertilizantes, reduzindo custos e impactos ambientais.
A China, que alimenta um quinto da população global com menos de 10% das terras aráveis do mundo, vê na digitalização uma solução para aumentar a eficiência e atrair jovens para o campo, pois 60% dos agricultores têm mais de 50 anos. O plano também inclui um mapa unificado de terras agrícolas e algoritmos para previsão de safras, fortalecendo a resiliência contra mudanças climáticas e crises globais. Além disso, busca reduzir a dependência de importações, um ponto crítico em tempos de instabilidade nas cadeias de suprimento e desglobalização.
E o que será de nossa balança comercial se a China se tornar “soberana” na produção de alimentos? Teremos como construir reservas de produção? Poderemos vender para outros países?
No momento, parece improvável que tenhamos mentes, exército e diplomatas para enfrentar um mundo em que a tecnologia e segurança serão essenciais para o transporte e o comércio exterior.
Parece que não estamos construindo meios para garantir a segurança de nossos produtos nos mares, na nossa projeção de poder e influência pelo mundo e demais elementos essenciais para nos mantermos como exportadores.