Sanções e Risco Sistêmico: Por que o Brasil Não Controla Todos os Botões

Publicado em 13 de Agosto de 2025

Sanções internacionais, mais do que abranger questões diplomáticas ou jurídicas, funcionam como gatilhos que acionam uma rede global de proteção contra riscos no sistema financeiro. Essa rede é formada por instituições e mecanismos que operam fora das fronteiras nacionais e que não precisam de autorização do Brasil para agir. Sua lógica é preservar a integridade e a previsibilidade das operações financeiras em escala global, e, por isso, reage rapidamente quando identifica riscos relevantes.

Bancos com atuação global dependem de uma estrutura complexa e interligada. Há os correspondentes no exterior, que liquidam operações em moeda forte; os custodiantes, responsáveis por guardar e administrar ativos; as bandeiras de cartões, que processam pagamentos; e as auditorias globais, que certificam a conformidade das práticas com padrões internacionais. Essa engrenagem, quase invisível para o cliente, é a base que mantém o dinheiro circulando com segurança e eficiência.

Quando uma instituição entra em conflito com sanções reconhecidas por esses atores, a reação pode ser rápida e silenciosa. Não é preciso esperar decisões judiciais ou comunicados formais. Limites de crédito podem ser cortados, prazos de liquidação encurtados, exigências de garantias aumentadas e o acesso a moedas fortes encarecido ou restrito. Em alguns casos, as contrapartes internacionais simplesmente deixam de operar com o banco, isolando-o de partes críticas do mercado.

Essas medidas, conhecidas como “de-risking silencioso”, surgem sem anúncio público. São ajustes graduais que, somados, encarecem e dificultam cada operação. Para o cliente final, tais ajustes podem parecer burocracia ou atrasos pontuais. No mercado, são sinais claros de que a confiança na instituição foi abalada e de que ela passou a ser vista como um ponto de vulnerabilidade.

O efeito não se limita ao banco diretamente atingido. Se ele tiver relevância no mercado, o impacto se espalha por toda a rede. Empresas que dependem de suas operações internacionais enfrentam atrasos, custos adicionais e, em alguns casos, bloqueios de transações essenciais. Investidores reavaliam sua exposição, enquanto outros bancos precisam absorver clientes e fluxos inesperados, o que pressiona a liquidez e encarece o crédito.

Esse efeito cascata pode rapidamente se tornar um risco sistêmico. O câmbio sofre com a redução da oferta de moeda estrangeira, spreads bancários aumentam, operações de hedge ficam mais caras e menos acessíveis, e o fluxo de capitais externos perde intensidade. Muitas vezes, não há um anúncio formal: é o acúmulo dessas restrições que desorganiza o funcionamento do sistema, minando a confiança de forma progressiva.

Para instituições com forte presença internacional, ignorar sanções é mais do que uma decisão política interna. É uma aposta de alto risco que pode comprometer a capacidade de operar de forma integrada ao mercado global. O custo vai muito além da perda de receita ou da fuga de clientes. Inclui o risco real de ser cortado de canais vitais de liquidez, de meios de pagamento e de estruturas de compensação internacional. E os banqueiros que optarem por esse caminho não poderão alegar surpresa quando tomarem um passa moleque do Departamento de Estado americano.

O sistema financeiro global é interdependente. Uma decisão que afete a confiança em um grande banco não se limita a ele: reverbera por toda a rede, afetando crédito, liquidez e estabilidade. Ignorar essa dinâmica é subestimar a engrenagem que mantém o mercado funcionando e sustenta a confiança que, no fim, é o ativo mais valioso de qualquer instituição financeira.

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