O fim da ilusão de normalidade: como o mercado está reagindo em silêncio

Durante anos, o Brasil manteve a narrativa de estabilidade institucional, repetida por parte da imprensa, setores do Congresso e, principalmente, pela elite financeira entre Faria Lima e Brasília. O discurso era recorrente: apesar das tensões políticas, o país preservava um sistema funcional, com marcos legais sólidos e previsibilidade regulatória. Manter a ilusão de normalidade era parte da estratégia para a fluidez dos negócios.

Essa ilusão, no entanto, começou a ruir. E o sinal mais evidente não veio da política, mas do próprio mercado, justamente o setor que, até pouco tempo, proclamava neutralidade institucional enquanto lucrava com a incerteza. A imposição de tarifas pelos Estados Unidos e a inclusão de autoridades brasileiras em listas de sanção por violações de direitos humanos abriram uma fissura que já não se recompõe com discursos otimistas ou editoriais defensivos.

Ainda que tentem apresentar o episódio como exagero ou retaliação pessoal, o incômodo central permanece: o Brasil passou a ser lido como jurisdição de risco. O sistema político já não oferece garantias mínimas de equilíbrio. O ambiente legal tornou-se instável. E o próprio Judiciário, em vez de projetar segurança, passou a representar imprevisibilidade.

A reação do mercado não foi pública, mas é inequívoca. Fundos passaram a simular cenários de sanção. Departamentos jurídicos iniciaram reavaliações internas sobre exposição institucional. Bancos, inclusive estatais, começaram a rever fluxos e vínculos sensíveis. Não houve pronunciamento oficial. Mas os movimentos discretos revelam o diagnóstico: o Brasil deixou de ser apenas um país difícil. Tornou-se uma variável a ser contida.

Esse processo não é motivado por ideologia. O alerta vem da lógica do risco regulatório. Violações de garantias, imprevisibilidade legal e decisões arbitrárias formam um conjunto que ameaça contratos, fluxos e reputações. E para quem opera em escala internacional, isso não é detalhe. É passivo sistêmico.

Enquanto isso, a imprensa tenta preservar o verniz institucional. Sugere que tudo se resume a ruídos entre lideranças. Ignora — ou silencia — que os principais agentes econômicos já abandonaram a tese da normalidade. Continuam operando, sim. Mas com cautela, ajustando exposição e redesenhando cenários.

A ruptura real não acontece quando a crise é reconhecida. Ela se consuma quando não se vê mais sentido em negá-la. E o silêncio da Faria Lima, neste momento, fala mais alto do que qualquer editorial. Já não é negação. É contenção deliberada.

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