O Custo do Provincianismo Geopolítico

Publicado em 28 de Novembro de 2025

Quando se disseca a anatomia de um colapso de credibilidade, o observador comum tende a focar na moralidade dos atores. No entanto, essa visão ignora o mecanismo real que leva às quedas: a arrogância sem lastro. Brasília está operando exatamente como um apostador que ignora as chances da banca, colocando fichas de autoridade que não possui na geopolítica global. Eles se fizeram acreditar que a especulação jurídica que se tornou banal no Brasil construiria um país blindado às influências externas, assim como se dizia que a especulação financeira construiu a América. Mas o incidente envolvendo a Coca-Cola e o Departamento de Estado americano prova o erro dessa tese e avisa para quem quiser ouvir, que as apostas desmedidas do governo e do mercado financeiro estão se aproximando de uma margin call inevitável.

O erro das empresas que patrocinaram o evento onde um sancionado do governo americano foi a estrela foi de cálculo, não de moral. Elas presumiram que seria apenas mais um rito institucional, um pedágio necessário para transitar na corte. Esqueceram de que, no sistema financeiro global, a radioatividade de um sancionado não respeita fronteiras nem boas intenções. 

Em agosto passado, o país assistiu a mais um “passe de mágica” jurídico, onde o Judiciário decidiu que punir a Starlink (empresa A) era uma forma válida de cobrar dívidas da X (empresa B), baseando-se na premissa gasosa de um “grupo econômico de fato”. A distinção de personalidades jurídicas, pilar sagrado do capitalismo, foi tratada como detalhe, descartável pela vontade de punir. O recado foi brutal em sua simplicidade: a propriedade privada no Brasil é uma concessão provisória do humor estatal. As empresas que hoje correm para marcar reuniões com o Banco Central acharam que a guilhotina cairia apenas em quem se coloca no holofote político. Ledo engano. A jurisprudência da exceção se comporta como um gás, ocupando todo o espaço disponível.

Isso não é o governo americano fazendo política externa: é o simples saneamento do seu sistema financeiro. As sanções secundárias atuam como um antibiótico de largo espectro que elimina não apenas o agente infeccioso, mas qualquer tecido que lhe dê sustentação.

Roberto Campos Neto agora atua também como um diplomata em zona de exclusão nuclear, tentando explicar ao capital estrangeiro que o Brasil ainda é um país viável, enquanto as instituições domésticas operam como um cassino sem regras. É um esforço de Sísifo. O investidor global olha para o Brasil e não consegue enxergar uma “democracia pujante”, apenas o risco de cauda. Vê um lugar onde patrocinar uma reunião jurídica pode resultar em exclusão do sistema SWIFT. Isso afasta os investidores sérios e atrai, infelizmente, apenas aqueles que desejam sugar a economia se aproveitando do caos social.

Se a lei no Brasil é um cadáver insepulto, manipulado para justificar caprichos, o cálculo de risco se torna impossível. A morte da lei, quando executada pelas mãos de quem deveria protegê-la, não permanece confinada ao Judiciário. Gera metástase. Contamina relações comerciais, infecta expectativas de investidores, corrói a confiança em qualquer economia minimamente sofisticada. As multinacionais aprenderão que o custo Brasil agora inclui um prêmio de risco por imprevisibilidade judiciária. 

No fim, é irônico ver que a tomada do Judiciário, que se pretendia absoluta internamente, caminha para tornar o país um pária externamente. A toga pode mandar prender e soltar mas, em Wall Street, ela é apenas um item de compliance entre cleptocratas e regimes falidos.

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