Integração nacional e projeto político — uma fenomenologia da vida em comum

No Brasil, há uma crença — alimentada por parte da elite — de que a política é um componente técnico da vida nacional, e que bons administradores são aqueles que seguem fórmulas normativas, defendem a ortodoxia econômica e constroem relações comerciais voltadas à atração de investimentos.

Tal convicção é essencial para a manutenção de um modelo burocrático de governança, voltado para um formalismo jurídico em que não se respeita a vontade política do povo, mas as normas inscritas na Constituição. O problema não está em existir uma Constituição que regulamente algumas relações pontuais; ele surge quando a estrutura de governança é puramente burocrática e totalmente alienada da vida nacional.

Uma nação não é simplesmente uma unidade política integrada por um aparato burocrático que pactua Estados, municípios e cidadãos. É um projeto em comum entre os órgãos nacionais, em que todos os cidadãos têm uma visão semelhante sobre si e sobre o rumo do país.

Há muito tempo o Brasil não goza desse tipo de unidade, seja pela natureza centralizadora do regime militar, seja pela inspiração burocrática e social-democrata da Constituição de 1988.

Essa perspectiva tecnocrática e apolítica é um dos obstáculos à construção de um projeto nacional. As pessoas, os políticos e os agentes públicos precisam adquirir uma perspectiva geral e experiencial do que é o Brasil. É necessário compreender a vida nacional brasileira.

Essa visão tecnocrática neutraliza a perspectiva vital da nação, transformando instrumentos de cálculo em critérios absolutos do que existe politicamente. Modelos, métricas e protocolos são alçados à condição de realidade normativa. Nesse movimento, a política é privada de sua vitalidade — afasta-se da vida do brasileiro e passa a remeter-se apenas aos números em uma planilha, uma casa de máquinas indiferente à vida humana.

A vida comum escapa às medições objetivas. Para compreendê-la, especialmente no contexto brasileiro, é necessário habitar uma dimensão anterior aos parâmetros técnicos — aquela do mundo vivido, onde a experiência precede qualquer estrutura normativa. 

É preciso ver como é a vida brasileira, a vida dos brasileiros, e como os brasileiros veem sua própria vida. Pode parecer redundante, mas esses elementos são excluídos da grande maioria das análises e projetos políticos: como o brasileiro vive? Como gostaria de viver e por que quer viver de tal maneira? 

A tecnicidade que se apresenta não parece satisfazer os brasileiros — a esta altura isolados, desarticulados e com profunda falta de pertencimento nacional —, que não querem ver uma casa de máquinas funcionando perfeitamente ou sistemas jurídicos harmoniosamente autofágicos. 

Pensar o Brasil como um projeto de vida comum é o primeiro passo para oferecê-lo à população como uma empreitada de construção nacional — um país moldado por mãos brasileiras e destinado a seu povo. Um projeto de existência digna, não de mera sobrevivência.

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