
Publicado em 22 de Novembro de 2025
Quase todo brasileiro já ouviu o discurso futurológico em que o Brasil é um país desenvolvido, próspero e de primeiro mundo — o país do futuro.
Os argumentos que sustentam essa tese de futuro brilhante são sempre os recursos naturais abundantes no solo brasileiro, a extensão territorial e sua localização geopolítica segura em uma região com poucas rivalidades e conflitos.
Essas crenças soam como infantis para qualquer pessoa que vivencie o Brasil, justamente porque reina a sensação de que falta algo para que o país realize esse potencial.
É sempre a geografia, a localização privilegiada e sem conflito que supostamente garantirão o futuro brilhante do Brasil.
Nunca é o projeto nacional que explora esses recursos, muito menos o desenvolvimento humano e a organização política como garantia da prosperidade; o fator humano é sempre excluído.
Em sua obra “Política”, Aristóteles analisa como são formadas as estruturas que possibilitam as associações humanas e sua sobrevivência sedentária.
O órgão fundamental que possibilita o surgimento e a articulação de todos os outros é a família, em grego, o oíkos (οἶκος), onde o convívio é mínimo e voltado às necessidades mais imediatas: a união de homem e mulher, a relação senhor–escravo, tudo é orientado apenas para sobreviver.
Se a família consegue sobreviver, pode ser possível reunir os clãs em uma aldeia, comunidade um pouco mais ampla, que ainda gira em torno do mesmo eixo: garantir a vida, produzir o básico, resistir às carências.
Só quando várias aldeias se associam surge a pólis, a cidade, que Aristóteles chama de “koinonía téleios” (κοινωνία τελεία), comunidade completa, justamente porque alcançou a autossuficiência: ali se concentram defesa, leis, cultos, educação, economia, tudo o que permite não só viver, mas viver bem.
É nessa passagem do simples viver (ζῆν) para o viver bem (εὖ ζῆν) que a cidade se torna a forma mais alta de convivência; ela não é apenas um aglomerado de casas, mas o espaço onde os homens compartilham não só o sustento e a segurança, mas também palavras, julgamentos, deliberações sobre o justo e o injusto, o útil e o nocivo.
A cidade demanda um projeto de vida comum, um plano de manutenção de sua autossuficiência e da busca da justiça, e essa é a configuração que formaliza a dinâmica do político.
A política vive da tensão entre amigos e inimigos, com esses grupos antagônicos apresentando projetos para a vida comum da cidade.
Para que a cidade seja fundada, é necessário unir os clãs em torno de um projeto de convivência comum, para então determinar sua vida econômica, legal e institucional.
São os homens da cidade que promovem a tomada da terra, a divisão e localização do espaço e a exploração dos recursos. O Brasil sequer tem seu projeto de convivência comum; como poderá organizar o uso desses recursos naturais de que dispõe?
Os recursos disponíveis serão usados para quais fins?
A localização geográfica em um ponto pacífico e sereno da América Latina, somada à extensão territorial, servirá a que propósito?
O Brasil não se transformou nesse país do futuro porque não há um projeto de nação para ser posto em curso, não há uma proposta de vida comum que una as pessoas.
Os clãs estão desarticulados e os bens públicos são utilizados para beneficiar uma casta oligárquica que não se importa com o futuro do país e muito menos em unir os projetos de vida da elite e do cidadão comum.
O Brasil precisa nascer como cidade para se desenvolver como nação. É necessário um projeto de reconstrução nacional.