Publicado em 12 de Agosto de 2025
O cenário brasileiro indiscutivelmente mudou, e a gravidade da mudança é perceptível mesmo sem uma análise aprofundada de segurança. Nos últimos dias, três fatos, aparentemente desconectados, desenharam uma nova e preocupante narrativa sobre o país. Primeiro, a mobilização do Pentágono por uma guerra mais incisiva contra cartéis, agora tratados como organizações terroristas. Depois, a CIA, a serviço da Casa Branca, enxugou e simplificou o perfil do Brasil em seu “factbook”. Por fim, um mapeamento interno revelou 64 facções criminosas espalhadas por quase todo o território nacional.
Para o mercado financeiro, especialmente a Faria Lima, esses eventos até podem ser vistos como “ruído”. Mas o ruído, cedo ou tarde, se traduz em números na planilha. E o que os números estão dizendo? Que a percepção externa de risco sobre o Brasil atingiu um novo patamar, e a omissão interna de alguns vai custar caro.
A narrativa de que o crime organizado é um problema de “segurança pública” já não se sustenta. O mapa das facções mostra que a criminalidade não está restrita a becos e morros; ela se cruza com corredores de exportação, portos e o transporte de commodities. Ou seja, o crime está onde o dinheiro circula, atuando dentro da economia formal. Isso é o que a inteligência americana e os bancos internacionais enxergam, e não dá para fingir que não existe.
A classificação de cartéis como organizações terroristas, por exemplo, eleva drasticamente o risco jurídico para qualquer elo da cadeia econômica que tenha, de alguma forma, alguma ligação com tais atividades. Os Estados Unidos não negociam com o terror. De repente, um banco, uma seguradora ou um operador logístico pode ser responsabilizado por envolvimento indireto com o crime, mesmo que não saiba. A reação é imediata e previsível: o mercado tem que se proteger.
E a proteção vem na forma de um fenômeno conhecido como de-risking. Bancos e investidores internacionais não esperam por sanções oficiais ou declarações de guerra. Eles agem de forma preventiva, reduzindo a exposição, cortando linhas de crédito e impondo condições mais duras para liberar recursos. O resultado direto para o Brasil é menos liquidez, prazos mais longos para fechar negócios e custos mais altos, especialmente para setores de commodities e transporte internacional.
A atitude da CIA de simplificar o perfil do Brasil é um golpe sutil, mas poderoso. Ao reduzir a informação oficial, ela aumenta a dependência do mercado por relatórios privados e, consequentemente, mais conservadores. Isso significa que a percepção de instabilidade e imprevisibilidade já está no ar, influenciando decisões de investimento e custo de seguros.
O mercado financeiro brasileiro, por muito tempo, optou pelo silêncio. Ignorou injustiças, perseguições, censura e a erosão de instituições, apostando que isso não afetaria os negócios. No entanto, a conta do silêncio está chegando. A crise institucional se traduz em custos maiores, prazos mais longos e menos liquidez. São frutos amargos que o próprio mercado terá de colher.
A Faria Lima precisa entender que a crise institucional não é um mero “ruído”. A convergência de sinais vindos do Pentágono, da CIA e dos relatórios internos demonstra que o país está sendo visto como um terreno de risco elevado. E para quem vive de risco, essa é uma notícia que não pode ser ignorada. O custo da omissão está na mesa e a Faria Lima, sempre tão desconectada da vida real, vai pagar caro.