A “heresia” de pretender industrializar a Amazônia

por: Lorenzo Carrasco e Geraldo Luís Lino

Publicado em 23 de Novembro de 2025

Poucas vezes a mentalidade e o modus operandi do aparato internacional que manipula as questões ambientais e indígenas para influenciar as políticas públicas no Brasil ficaram tão evidenciados como na matéria da Folha de S. Paulo intitulada “Ministro da pasta campeã de emendas para máquinas defende industrializar a Amazônia”, publicada em 15 de novembro.

Nela, o jornalista Flávio Ferreira, enviado do jornal à conferência COP30, entrevista o ministro da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), Waldez Góes, e o questiona sobre uma reportagem anterior sua sobre a entrega pelo ministério de mais de 1.600 máquinas pesadas a municípios da Amazônia Legal por meio de emendas parlamentares desde 2015.

De acordo a apuração, os principais distribuidores de máquinas pesadas na região têm sido o programa Calha Norte, recém-transferido do Ministério da Defesa ao MIDR, e a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), que “tiveram suas finalidades históricas desvirtuadas nos últimos anos para se tornarem os emendodutos (sic) preferenciais dos congressistas brasileiros”, sendo o MIDR “o terceiro colocado no ranking das entregas de máquinas desde 2015”.

Sob um disfarce de investigação jornalística, o autor trata com capciosidade a entrega de máquinas pesadas a uma região carente de infraestrutura moderna e que exibe os piores indicadores socioeconômicos do País. Em muitos casos, emendas parlamentares constituem a única possibilidade de que prefeituras de municípios carentes de recursos próprios tenham acesso a tais equipamentos. E convenhamos que 1.648 máquinas em dez anos representam uma média de 164 por ano, o que, distribuído pelos 772 municípios da Amazônia Legal, implica em um equipamento para cada cinco deles a cada ano – muito pouco para justificar um pretenso “escândalo”.

Interrogado a respeito, Waldez Góes afirmou:

“Eu sempre digo que, no geral, as pessoas conhecem pouco as iniciativas governamentais, privadas e sociais da Amazônia, que tem muitas, e acabam enxergando com muita recorrência o garimpo ilegal, a pesca ilegal, o desmatamento ilegal, que também ocorrem, mas não é majoritariamente. A Amazônia está cheia de boas práticas, isso também em relação à inovação em tecnologia, equipamentos. Você imagina a Amazônia sem pesquisa, sem tecnologia, sem inovação? Nós vamos passar mais um século sendo fornecedor de matéria-prima para a indústria paulista ou para a indústria internacional?

“Então, a gente tem que romper essas lacunas. Como é que se rompe? Nós precisamos industrializar a Amazônia. A gente precisa inovar a Amazônia. A gente precisa de tecnologia. Então, essa é a lógica.”

Na sequência, Ferreira pergunta o óbvio: O senhor avalia que o maquinário distribuído por meio das emendas hoje é necessário para essa industrialização?”

Waldez Góes:

“Ele é essencial. Lá no passado, sob uma lógica de ocupação da Amazônia ou de reforma agrária, fizeram loteamentos, são centenas de quilômetros. As pessoas que se virem para chegar com aluno na escola, que se virem para chegar uma energia lá, uma internet? E aí a ponte quebra, o prefeito não tem condições de fazer o ramal. Então eu estou olhando a política pública. Você aparelhar os municípios, aparelhar a sociedade para melhorar a condição de vida na Amazônia.

“Teve um prefeito que cometeu um erro, puna esse prefeito. Teve uma entidade que cometeu um erro, puna essa entidade. Agora, eu não posso partir da lógica que um prefeito usou uma máquina de forma indevida para acabar com a política pública que nunca aconteceu.

“Eu sou de um estado [Amapá] que tem 96% da cobertura vegetal preservada. Fui governador quatro vezes. Então, eu fui responsável ambientalmente. Mas só eu fui? Não, os outros também foram. A iniciativa privada também é. E a população tradicional também é. É a nossa cultura. Então, nós temos o direito de ter tecnologia para esse povo produzir e para as prefeituras trabalharem.”

As perguntas e as respectivas respostas expressam as visões diametralmente opostas que geralmente se verificam entre urbanóides que vivem a milhares de quilômetros e a maioria dos residentes dos estados amazônicos, que aspiram a desfrutar dos benefícios de infraestruturas modernas e atividades produtivas análogas às desenvolvidas no Centro-Sul do País.

E o ministro ainda transmite uma mensagem final da maior relevância:

“O maior problema ambiental da Amazônia é saneamento básico. Os nossos indicadores de saneamento básico são desafiadores. E o custo também para assim o fazer, seja a água, seja o tratamento do esgoto sanitário, seja o resíduo sólido, é muito alto. Então é preciso que a comunidade nacional e internacional olhe para a Amazônia, quando discute a questão ambiental, não só em relação ao rio e à floresta, mas o que o saneamento básico, ou a falta dele, é capaz de provocar, tanto no rio quanto na floresta.”

Por sua vez, Flávio Ferreira não é um urbanóide comum. Além da Folha, ele também é vinculado à Rainforest Investigations Network (RIN), patrocinadora da referida série de reportagens. Segundo o seu síte, a RIN “aproveita reportagens investigativas e colaboração transfronteiriças para expor a interseção das mudanças climáticas, corrupção e governança na Amazônia, Bacia do Congo e Sudeste da Ásia”. 

A RIN é um projeto do Pulitzer Center, ONG estadunidense que financia projetos jornalísticos sobre diversos temas, inclusive ambientais e indígenas. Seu diretor de investigações ambientais é Gustavo Faleiros, ex-repórter do Valor Econômico, e entre os seus patrocinadores, encontramos nomes habituais da constelação de fundações privadas e agências governamentais que financia o aparato “verde-indígena” internacional: Clinton Family Fund; Ford Foundation; Gates Foundation; Betty and Gordon Moore Foundation; John D. and Catherine T. MacArthur Foundation; Agência Norueguesa para Cooperação para o Desenvolvimento (NORAD); Iniciativa Internacional Norueguesa de Clima e Florestas (NICFI); Omidyar Network; Walton Family Foundation; e outras.

Em essência, o que Flávio Ferreira está fazendo é replicar e retransmitir o pilar central da estratégia do aparato ambientalista-indigenista globalista para a Amazônia: nada de industrialização e atividades econômicas modernas – é preciso “preservá-la” como um santuário ecológico e colateral para créditos de carbono e outros instrumentos de “finanças verdes”.

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