Meros parlamentares

Publicado em 25 de Novembro de 2025
O movimento bolsonarista é claramente imaturo, pouco articulado e sem militância organizada. Mas, mesmo com todo o despreparo e a falta de aparato, há afrontas à lógica que não devem ganhar publicidade.

Como é possível que parlamentares, eleitos sob a bandeira do projeto de reconstrução nacional do bolsonarismo, possam prestar apoio ao seu líder por meio de vídeos e manifestações públicas de indignação?

Parece que parlamentares em posse de cargos oficiais, dotados de legitimidade e poderes, não podem fazer absolutamente nada por Bolsonaro.

Para que não se perca o senso das proporções ou seja cometida alguma injustiça, convém comparar as ações dos parlamentares petistas com as da base bolsonarista:

Logo após a ordem de prisão de Lula, em abril de 2018, a bancada do PT tratou o caso explicitamente como “prisão política” e passou a combinar ação institucional no Congresso com mobilização de rua e campanha pública permanente por sua libertação.

Por tratar-se de uma prisão política, segundo o partido, as manifestações foram internacionais, com direito a estudos e análises de think tanks a respeito do processo que prendeu Lula.

Zanin foi aos EUA estudar lawfare, e o Grupo de Puebla publicou uma série de estudos sobre perseguição judicial a líderes de esquerda pela América Latina. O resultado é conhecido: Lula foi liberto, reabilitado e hoje preside o Brasil.

Já a direita teceu críticas a Eduardo Bolsonaro — que foi para os EUA e atraiu sanções para os violadores de direitos humanos no Brasil —, teve parlamentares que alegaram não ter meios de reagir contra a tirania e produziu muitos vídeos, reações histéricas e confissões de impotência.

Os parlamentares eleitos pelo movimento bolsonarista agem como se parlamentares não estivessem investidos dos mais altos poderes da República, como se oficialmente não tivessem à disposição acesso a mudanças na lei, à estrutura das instituições e a todas as demais benesses às quais um parlamentar tem acesso.

Se, investidos de poderes oficiais, já não conseguem fazer nada, não militam por sua causa e não podem acudir Bolsonaro, o que fariam se dependessem apenas do poder e da influência que se exerce longe dos cargos oficiais? Qual a utilidade desses parlamentares para a causa bolsonarista de reconstrução nacional?

Bertrand de Jouvenel, em sua obra “O Poder”, trata do que chamou de “militarização da política”, que não é simplesmente a presença ostensiva de generais nos governos ou a golpes de Estado episódicos; trata-se de um processo histórico em que a lógica própria da instituição militar — centralização do comando, obediência hierárquica, mobilização permanente e legitimação pela ameaça externa — infiltra-se progressivamente no funcionamento ordinário do poder civil. Em sua análise do crescimento natural do poder, Jouvenel mostra como a construção do Estado moderno se deu em estreita ligação com a guerra: a necessidade de manter exércitos permanentes, financiar campanhas e organizar a defesa levou à expansão das capacidades fiscais, administrativas e de controle social, transformando súditos em recursos mobilizáveis e cidadãos em “matéria-prima” de campanhas militares e políticas.

Nesse sentido, a política ordinária e cotidiana exige disciplina, organização e formalização de uma militância. 

Munidos dos recursos oficiais da República brasileira, não poderiam esses “meros parlamentares” ter organizado essa militância? Não deveriam estar em busca de formalizar e exercer poder para alcançar os objetivos da agenda bolsonarista?

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