O mercado financeiro costuma se apresentar como um espaço de racionalidade e leitura precisa dos sinais. Mas os acontecimentos recentes expõem um paradoxo: quando a crise institucional deixa de ser um risco teórico e se materializa em sanções vindas dos Estados Unidos contra figuras centrais do regime, a reação predominante não é de transparência, mas de silêncio. E o silêncio, neste caso, faz mais barulho do que qualquer comunicado oficial.
O Ibovespa em queda e o dólar a R$ 5,36 vão além de movimentos técnicos, reações a fluxos de capital ou ajustes de posições. Representam a percepção de que há uma instabilidade política latente, que o Brasil insiste em não enfrentar. O investidor estrangeiro, que precifica risco de forma objetiva, não se deixa enganar por discursos de estabilidade. Já o investidor doméstico, mesmo ciente da gravidade da situação, adota a estratégia de esperar, como se o tempo fosse capaz de dissipar incertezas institucionais. Esse desencontro cria um ambiente de cinismo: todos sabem o que está acontecendo, mas fingem que nada mudou.
O impacto vai além do câmbio e da bolsa. O que está em curso é uma corrosão gradual da confiança no país como jurisdição segura. Quando a principal corte se vê no centro de questionamentos internacionais, e quando membros do establishment preferem adotar uma postura de negação, a mensagem enviada ao mundo é a de que o Brasil não consegue oferecer garantias mínimas de previsibilidade institucional. Esse tipo de percepção não se reverte com roadshows, apresentações técnicas ou planos de ajuste fiscal. Ela corrói silenciosamente a credibilidade, afastando investimentos de longo prazo e incentivando a busca por proteções externas.
O mais grave é que esse silêncio não decorre apenas de prudência. É um silêncio estratégico, calculado, uma tentativa de preservar a aparência de normalidade. Mas o mercado não vive de aparências: vive de sinais. E o sinal que hoje predomina é o da omissão. Em vez de reconhecer a gravidade do que está em curso, prefere-se cultivar o mito de que nada abala o “fundamento” do país. A consequência é a perda de ancoragem. O dólar deixa de ser apenas um preço de moeda estrangeira e passa a funcionar como termômetro da crise institucional. A cada centavo de valorização, registra-se o custo do silêncio.
Nesse contexto, a Faria Lima e Brasília se unem na mesma estratégia: ignorar. O primeiro, para não desvalorizar ativos e admitir que a estabilidade institucional tem preço. O segundo, para evitar que a discussão política se torne incontrolável. Mas a conta já chegou. O real depreciado, a bolsa em queda e os juros pressionados são a forma mais clara de dizer que a fuga da realidade não pode durar para sempre. A economia cobra por meio dos preços aquilo que a política tenta esconder com declarações evasivas.
A contradição fica ainda mais evidente em eventos como o Macro Day do BTG. Enquanto se multiplicam discursos sobre fundamentos sólidos e oportunidades de investimento, o mercado responde com fuga para o dólar e desvalorização de ativos locais. A retórica de confiança não resiste ao choque da realidade: os preços já internalizam o risco institucional que se tenta negar nos palcos corporativos.
O cenário atual não é apenas mais um episódio de volatilidade. É a confirmação de que a crise institucional brasileira ultrapassou fronteiras e agora repercute diretamente no sistema financeiro internacional. O silêncio diante disso emula neutralidade, mas, na verdade, é cumplicidade com uma instabilidade que já começa a custar caro. E o mercado, ainda que tente adiar esse reconhecimento, já demonstra nos números o que as palavras evitam dizer: o peso do silêncio é insustentável.