Supremas Cortes e a Nova Guerra da Informação

A retórica da “desinformação” tornou-se uma das mais poderosas armas políticas do nosso tempo. Quando ministros da Suprema Corte saem em turnê internacional para denunciar o “perigo” das redes sociais, o que está em jogo não é a defesa da verdade, mas o controle do discurso. A palavra-chave deixou de ser “fake news” — agora é “narrativa”. E isso nos transporta diretamente para o campo da guerra.

O ministro Barroso, ao afirmar que a desinformação é o maior risco para a democracia, não faz outra coisa senão legitimar a censura como forma de preservação institucional. Mas o que ele chama de democracia é, cada vez mais, uma arquitetura de comando. A lógica é militar. A linguagem é jurídica. E o alvo é você.

Desde a década de 1990, o conceito de guerra informacional vem sendo refinado dentro dos centros de comando americanos. A Guerra do Golfo foi o marco inaugural: a opinião pública ocidental foi mobilizada em tempo real com campanhas fabricadas de comoção, como o depoimento falso da menina Nayirah no Congresso dos EUA. Saddam foi promovido a novo Hitler. O jornalismo virou teatro. E a CNN virou arma.

Foi nesse momento que as Forças Armadas dos EUA entenderam que a informação não era mais apenas suporte — era munição. Mísseis são caros, demorados e deixam rastros. Já a manipulação de dados, manchetes e imagens podem vencer batalhas inteiras sem um único disparo. A desinformação, neste contexto, não é erro: é estratégia. E quem denuncia a desinformação pode estar apenas tentando monopolizar a versão dos fatos.

É por isso que a guerra hoje não se dá apenas na camada física (infraestrutura de rede), nem na lógica (algoritmos). Ela ocorre, sobretudo, na camada cognitiva, na modelagem da percepção. Cortes Supremas, ao se engajarem no policiamento do discurso digital, não estão atuando como guardiãs da democracia, mas como operadoras do campo de batalha.

Não se trata de teoria da conspiração. Trata-se de doutrina. A dominação informacional — conceito definido em manuais militares dos EUA desde os anos 1990 — inclui operações psicológicas, guerra de narrativas, desorganização de redes adversárias e controle de fluxos digitais. Trata-se de minar a capacidade do inimigo de pensar fora do previsto.

Nesse cenário, o papel das Big Techs é ambíguo. Por um lado, são os novos Estados. Por outro, são alvo da desconfiança de quem perdeu o monopólio do discurso. As Cortes constitucionais tentam recapturar o que perderam: a capacidade de determinar o que pode ou não ser dito. Sob o pretexto de proteger a democracia, o que se instala é a doutrina do pensamento autorizado.

O Brasil se tornou um laboratório disso. A censura vem pela toga, mas sua lógica vem dos manuais de guerra eletrônica. A batalha não é mais por verdades, mas por hegemonia discursiva. A desinformação virou desculpa para interditar dissensos. A democracia virou pretexto para estabelecer um tipo de regime onde só um lado pode falar.

Como já vimos no GEO Economia, o que está em disputa não é o conteúdo da informação — é o seu controle. E quem controla o discurso, controla o imaginário. A guerra da informação é a guerra do século XXI. E os tribunais que antes eram os últimos bastiões da liberdade, agora se arriscam a ser seus primeiros algozes.

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