Justiça e Confiança Desequilibradas

A ideia de justiça imparcial é um dos pilares fundamentais em qualquer democracia. No Brasil, a percepção de grande parte da população em relação à justiça não é esta e vem gerando muitos questionamentos.

A sociedade acompanha algumas situações que parecem aproximar demais o poder do Judiciário de certos interesses. Um bom exemplo é a participação do ministro Barroso numa festa, em que até cantou, “dialogando” com o CEO do iFood. A presença de um juiz em um evento “informal” com alguém que tem processos na sua própria corte levanta dúvidas sobre a neutralidade e a distância que um magistrado deveria manter em um processo.

Outro ponto que ganha destaque é o “Gilmarpalooza”, que acontecerá agora em julho. Mais uma vez, ministros do Supremo Tribunal Federal são esperados em Portugal para “conversar” com executivos de grandes instituições financeiras, como o BTG Pactual. Empresas que, por coincidência, têm um volume considerável de processos tramitando exatamente na Corte que esses ministros compõem. Embora esses encontros sejam justificados como “networking” ou “diálogo estratégico”, a imagem que se projeta é a de um ambiente onde a segurança jurídica é tratada de forma particular, distante da formalidade dos tribunais.

Essa percepção de tratamento diferenciado afeta diretamente a confiança do público no sistema de justiça. Enquanto a população em geral busca soluções em processos lentos e burocráticos, a imagem de encontros em cenários luxuosos sugere um acesso privilegiado para poucos.

O contraste se evidencia quando comparamos com situações em outras esferas. O ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, teve uma reunião com embaixadores no Palácio do Planalto para discutir temas eleitorais. Esse encontro, que era formal e público, gerou uma forte reação, resultando em sua inelegibilidade.

Aí surge a questão central: se um diálogo em ambiente formal é rigorosamente questionado e até punido, por que encontros informais de magistrados com partes interessadas em seus julgamentos não geram a mesma intensidade de questionamento midiático e institucional? A coerência nos padrões éticos aplicados a todos os agentes públicos deveria ser o básico. Há que se demonstrar imparcialidade não só nas decisões da corte, mas também na conduta e nas interações de seus membros, evitando qualquer vestígio de privilégio ou acesso diferenciado. O equilíbrio da balança da justiça depende disso. Na percepção do povo brasileiro, porém, esse equilíbrio está longe de ser alcançado.

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