Em uma única semana, o setor produtivo brasileiro foi atingido por dois eventos com impacto direto sobre seus custos operacionais: a imposição de tarifas de 50% pelos Estados Unidos e a reoneração do IOF, implementada por decreto e validada posteriormente por decisão judicial. À primeira vista, podem parecer acontecimentos distintos. Mas, analisados em conjunto, revelam um problema estrutural: o Brasil está se transformando em uma jurisdição de risco institucional.
No caso das tarifas, o recado dos EUA foi direto. As medidas não foram motivadas por desequilíbrios comerciais nem por dumping. Foram uma resposta à instabilidade jurídica e à percepção crescente de que o país perdeu a capacidade de manter um ambiente regulatório confiável. A sinalização não foi econômica — foi política.
Já no caso do IOF, o Executivo editou um decreto para aumentar a alíquota. O Congresso rejeitou a medida por ampla maioria. Ainda assim, o aumento entrou em vigor, respaldado por decisão do Judiciário. O que era para ser exceção — um mecanismo provisório — foi normalizado como forma de governo. O Parlamento foi simplesmente ignorado. E o empresariado, mais uma vez, arca com o custo.
O ponto central não está nos tributos ou nas tarifas em si, mas no que esses episódios revelam: a desorganização do pacto institucional brasileiro. Hoje, é impossível saber com clareza quem tem a palavra final sobre temas essenciais da política econômica. O Executivo age por decreto, o Judiciário valida medidas controversas, e o Congresso perde função sem que isso provoque qualquer reação de reequilíbrio.
Para o investidor, isso significa operar em um ambiente onde decisões políticas podem ser implementadas sem trâmite legislativo, e onde a rejeição formal de uma norma não garante sua revogação prática. Em outras palavras, o custo não está apenas na medida em vigor, mas na impossibilidade de prever qual será a regra amanhã.
Essa insegurança tem efeito direto sobre crédito, câmbio, investimentos e contratos. E, mais grave ainda, enfraquece a interlocução do setor produtivo com o próprio Estado. Quando as decisões passam a ser tomadas em circuitos fechados, sem mediação institucional clara, o empresariado perde sua capacidade de negociar, propor ou sequer reagir. Torna-se objeto da política — e não mais sujeito.
O Brasil ainda possui um arcabouço legal robusto, mas sua aplicação tem sido cada vez mais marcada por interpretações casuísticas, inversões de hierarquia entre os Poderes e decisões unilaterais com efeito imediato. Isso é o oposto de segurança jurídica. E, no limite, compromete a lógica do investimento de longo prazo.
O que está em curso não é uma crise de governo. É uma mudança de regime institucional silenciosa, sem ruptura formal, mas com consequências profundas. Quando um decreto rejeitado continua em vigor, quando um Parlamento eleito é desconsiderado, e quando o setor produtivo paga a conta sem compreender as regras do jogo, a lógica econômica se desfaz. E com ela, a previsibilidade que sustenta qualquer ambiente de negócios sério.