Soberania contra a Nação

Recentemente, vimos o PT cobrando o direito ao exercício da soberania nacional, seja reclamando da interferência de agentes externos, seja atribuindo ao poder público o papel de resolver algum problema. Mas a soberania tem suas nuances e não se trata apenas da proteção da ordem institucional do Estado nacional ou mesmo da garantia do interesse da nação. Este poder pode muito bem servir à causa revolucionária. O poder soberano está pode estar intrinsecamente ligado ao poder de exceção, ao exercício de poder em tempos de crise, quando é preciso suspender ou alterar regras legais para garantir a sobrevivência e a unidade do Estado nacional. Em tempos de guerra, por exemplo, regras legais, direitos e processos são profundamente alterados para adequar a ordem jurídica à crise que eventualmente acometa uma nação. Assim, estas alterações, que só podem ser decretadas pelo soberano, podem ser instrumentalizadas por poderes revolucionários para promover um estado de terror e fundar uma nova ordem política.

A primeira forma de exercício do poder soberano é herdeira direta da figura do ditador romano: consiste numa suspensão temporária da legalidade com o objetivo de restaurá-la. Trata-se de um poder extraordinário concedido a um indivíduo ou órgão com a missão precisa de restabelecer a ordem ameaçada, sem questionar os fundamentos do regime vigente. Um exemplo clássico é o ditador nomeado pelo Senado da República Romana, como Cincinnatus, que assumia poderes excepcionais para enfrentar uma guerra ou revolta e, ao cumprir sua missão, renunciava ao cargo e devolvia o poder às instituições regulares.

Na modernidade, essa lógica se manifesta em dispositivos como o artigo 48 da Constituição de Weimar, que autorizava o presidente a governar por decreto em caso de emergência — uma prerrogativa pensada para proteger a ordem constitucional, ainda que sujeita a abusos. O poder soberano usado para preservar o Estado nacional, portanto, mantém como horizonte a ordem jurídica existente: o soberano age em nome de uma autoridade superior que permanece válida, mesmo quando sua aplicação se encontra suspensa.

Já os revolucionários, no exercício do poder soberano, não se limitam à preservação da ordem instituída, mas visam estabelecer uma nova. Eles suspendem a legalidade não para restaurá-la, mas para substituí-la. Os revolucionários criam um estado de terror e perseguição, sem se apoiar em normas preexistentes que devessem ser defendidas, mas reivindicando legitimidade a partir da ruptura. É o momento em que o poder assume diretamente a função constituinte.

Um exemplo paradigmático é o da Revolução Francesa, especialmente sob o domínio jacobino, quando a Convenção Nacional suspende a Constituição de 1793 e governa em nome do povo soberano, instaurando uma nova legalidade revolucionária. Outro caso é o da ditadura do proletariado, tal como formulada no contexto da Revolução Russa, que não busca conservar o direito burguês, mas aboli-lo como condição para instaurar uma nova ordem socialista; a suspensão da norma deixou de ser um meio de defesa para torna-se ferramenta de destruição do Estado nacional. Desta maneira, o poder não se justifica por sua função de proteção, mas por sua capacidade de instituir uma nova realidade jurídica e política.

Quando o PT defende seu direito ao exercício da soberania, não está exprimindo o direito de defender o Brasil. A verdadeira intenção é instrumentalizar o Estado para promover a revolução. Lênin já havia teorizado o uso do Estado para destruir a ordem política burguesa em O Estado e a Revolução, antes mesmo de promover a insurreição na Rússia. Quando você ouvir o PT falando em soberania, entenda que ele está cobrando o direito de usar o Estado para nos destruir.

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