
Nesta semana, Alfredo Setubal , CEO da Itaúsa, concedeu uma entrevista ao Valor Econômico que, à primeira vista, parece apenas mais uma análise de conjuntura por parte de um grande empresário. Mas o que está ali, nas entrelinhas, é algo mais profundo: a confissão de uma elite que se acostumou a lucrar com um país estagnado — e que só reclama quando o sistema deixa de servi-la.
Setubal lamenta os juros reais elevados. Diz que, com taxas acima de 7% ou 8%, a holding da família não consegue investir com retorno satisfatório. O capital precisa de, no mínimo, 20% ao ano para se mexer. Não encontrando isso, a solução é simples: repassar dividendos e manter o dinheiro parado. O Brasil, portanto, não é um desafio a ser enfrentado. É um obstáculo que precisa ser contornado, desde que continue rendendo alguma coisa.
A entrevista, no entanto, silencia sobre o essencial. Não há qualquer menção à insegurança jurídica que corrói os fundamentos do investimento. Nada sobre o avanço do crime organizado, sobre o enfraquecimento das garantias legais, ou o desequilíbrio entre os poderes da República. Nenhuma palavra sobre o apagamento da indústria nacional ou a deterioração das cadeias produtivas. Porque o problema, para essa elite, não é a falta de país. É a falta de margem.
Setubal também celebra a reforma tributária — não porque ela corrigiu distorções sistêmicas, mas porque eliminou um custo específico: a incidência de PIS/Cofins sobre os juros em cima capital próprio. Essa mudança, isolada, garantirá à Itaúsa uma economia anual de cerca de R$ 600 milhões. Enquanto isso, os pequenos e médios empresários enfrentarão um emaranhado de novas obrigações “verdes” e digitais, incompatíveis com sua estrutura. A reforma aliviou os grandes e intensificou o fardo dos menores. É um país moldado para quem já venceu.
O desconforto expresso por Setubal não é moral, institucional ou patriótico. É puramente financeiro. Não se trata de indignação com os rumos do país, mas de frustração com o rendimento dos ativos. Não é uma análise sobre como reconstruir o Brasil — é um alerta de que a planilha deixou de fechar.
A elite que Setubal representa não está preocupada com a transformação do país. Está preocupada em manter o fluxo. E quando nem isso funciona, começa o lamento.